22 março 2009

Confissões

Há dias Daniel Oliveira fez o balanço do 10º aniversário do Bloco, lembrando a sua experiência pessoal.
Após contar a forma como “nasceu” próximo do PCP, como colaborou e militou nas organizações de juventude do Partido e o processo que o fez afastar-se, ideologicamente, do PCP fala também daquilo que, na minha opinião, explica o aparecimento do BE. Sendo o BE, novamente na minha opinião, uma congregação de esquerdistas (cada vez menos), sociais-democratas (cada vez mais), radicais pequeno-burgueses, activistas de causas, mais ou menos de esquerda e progressistas, mas parcelares, é também uma organização criada para, pela esquerda, causar o maior prejuízo possível àqueles que, consequentemente, se afirmaram como os verdadeiros defensores dos interesses das classes trabalhadoras e do povo português.
Isto prova-se, entre outras formas, vendo quem foram, e são, os líderes do BE. Não vale a pena falar dos extraordinários contributos (ou terão sido traições?) que o MRPP (de onde vem Fernando Rosas) deu á consolidação do processo e das conquistas revolucionárias após o 25 de Abril. Ou os do PSR, com os SUV, de onde nos chegou Louçã. Ou o PRP-BR da Isabel do Carmo. Para não falar dos bombistas que, conspurcando a data gloriosa, criaram as FP-25 de Abril. Ou de outros que, como Daniel Oliveira, saíram do PCP. De todos, é com estes que menos simpatizo.
Criar organizações para sabotar as lutas do povo português, promover acções provocatórias e aventureiristas ou iludir alguns que, à partida, estariam predispostos a lutar por uma alternativa de esquerda é aborrecido, mas sempre existiram, quando a luta de classes se agudiza. Mas actuar dentro do partido de vanguarda, marxista-leninista, manobrando de forma a quebrar a sua unidade, tanto organizativa como de ligação às massas, incentivando o revisionismo teórico, lisonjeando traições que se vão consagrando noutros países, no fundo fazer de tudo para acabar com o partido a partir de dentro é a pior atitude de todas.
E é isto que Daniel Oliveira confessa. “… eu não podia ser mais marxista-leninista. Mas os desenvolvimentos na Polónia e uma viagem que fiz à Checoslováquia tinham-me tornado, é verdade, cada vez menos pró-soviético.” A que se refere DO? Será ao Solidarnorsc, criado pelas estruturas da Igreja Católica polaca, que se tem revelado um exemplo de democracia? Como pode alguém afirmar-se marxista-leninista e apoiar a traição polaca? Só se explica com o objectivo de semear a discórdia e confusão entre os militantes do Partido na altura, num contexto que todos conhecem.
A melhor é: “Gostava de Carrillo, de Berlinguer e de Tito.” Deve faltar aqui Marchais, para o triunvirato de traidores estar completo. E esta é a mais reveladora. Daniel Oliveira, assim como outros, pretendiam que o PCP seguisse alegremente o caminho para o abismo, indicado pelos carrascos dos, outrora gloriosos, partidos comunistas italiano, francês e espanhol. Assim, hoje o povo português teria um instrumento de luta e defesa dos seus direitos tão útil quanto o PCF, PCE ou o que sobra do PCI. Uma coisa é certa, caso a traição tivesse triunfado em Portugal, hoje não seria necessária a existência de um Bloco de Esquerda. Gostar de Berlinguer significa saber tudo o que ele fez, disse (“Io voglio che l'Italia non esca dal Patto Atlantico... Mi sento piu' sicuro stando di qua.”) e quais as repercussões que isso teve para a esquerda italiana e europeia.
“Acompanhei com esperança e imensas ilusões a Perestroika de Gorbachev. Mas quando o PCP apoiou o golpe dos ortodoxos aconteceu o afastamento emocional (que no caso do PCP nunca é fácil) definitivo.” Daqui nem sei por onde começar, não admito que alguém se diga de “esquerda” e acompanhe com “esperança e ilusões” as acções do traidor-mor e vendedor de relógios de luxo Gorbachev, compagnon de route de Thatcher, Reagan e João Paulo II, e será que DO esperava que o PCP também apoiasse essa traição?
“O Bloco começou a nascer com a queda do Muro…”. Fora as considerações acerca da utilidade e da discutível inteligência da construção do Muro de Berlim, a sua queda representa o fim dos muitos problemas e erros com que se debatiam a União Soviética e os países de Leste, mas representa também o fim das experiencias que levaram mais fundo a construção de uma alternativa socialista, o fim da existência de um bloco anti-imperialista e o fim das conquistas extraordinárias desses povos. Assim se vê que o BE não passa de uma nova modalidade do imenso rol de traições, herdeiro de muitas delas.

6 comentários:

Fernando Samuel disse...

Magnífico texto.
(é claro que se o PCP tivesse seguido o caminho preconizado por DO e pelos seus comparsas, o BE hoje não existiria - e o DO não teria as solicitações mediáticas que tem...)


Um abraço.

Orlando Gonçalves disse...

Gostei bastante deste teu texto. Vou passar mais vezes por aqui.
Abraço

filipe disse...

Saudações e parabéns pelo teu texto sobre o BE. É uma boa contribuição para o desmascaramento permanente que devemos fazer deste instrumento do sistema contra os que o combatem consequentemente todos os dias, como muito bem afirmas.
Abraço.

Anónimo disse...

Camarada Crixus
O mais triste da situação, é haver espaço politico, para estes politiqueiros oportunistas vendedores de ilusões, e parasitas do povo menos avisado e politisadoO meu pensamento está com o teu texto.
Abraço

samuel disse...

Citando Ary, "há que dizer-se das coisas o somenos que elas são..."

Abraço

miguel disse...

obrigado pelo texto crixus!
forte abraço!