28 dezembro 2008

Um autarca do futuro, hoje

O Presidente da Câmara Municipal de Moura (CMM), José Maria Pós-de-Mina, é um dos nomeados pela OneWorld para personalidade de 2008. A principal razão para a nomeação é a aposta e o apoio da CMM aos projectos de produção de energia renovável, nomeadamente solar, no concelho. Contudo, conhecendo razoavelmente o concelho, tenho a acrescentar que o trabalho do executivo é exemplar, não apenas nesse aspecto, mas em toda a gestão que tem feito da autarquia, desde o urbanismo à cultura.
Apesar de haver em Portugal quem não reconheça e, pior, negue o excelente trabalho, a incomparável honestidade e indesmentível competência dos autarcas CDU, eles são reconhecidos internacionalmente, sendo o Presidente da CMM apelidado de "autarca do futuro".
É ele próprio que lembra que "os obstáculos e as hesitações dos organismos do Estado" e os "ataques de forças políticas opositoras" dificultam o trabalho dos autarcas honestos e competentes, e prejudicam os interesses das populações. Apesar de tudo, os autarcas honestos e competentes continuam a trabalhar pelo bem da população, enquanto outros aguçam os dentes para o ano eleitoral que se avizinha.

Vale a pena ler a notícia do Público:

José Maria Pós-de-Mina anda nas bocas do mundo pelas melhores razões. Onde quer que vá toda a gente lhe lembra o que nunca sonhou ouvir: o seu nome saltou de Moura para o mundo. Uma revista norte-americana com distribuição mundial (OneWorld) de que a maioria dos seus conterrâneos não sabe o nome, considerou-o uma das 10 personalidades do ano do projecto de energias renováveis que desenvolveu no concelho de Moura.
Os critérios de selecção deste prémio exigem o empenhamento dos escolhidos nas questões dos direitos humanos, na justa distribuição dos recursos naturais e económicos; promoção de meios de vida sustentáveis, entre outros (ver texto nesta página).
José Maria Pós-de-Mina tem 50 anos. O presidente da Câmara de Moura é um cidadão discreto, mas ao mesmo tempo activista político desde os tempos da União dos Estudantes Comunistas. Está-lhe no sangue a filiação partidária. É filho, neto e sobrinho de militantes comunistas, alguns deles presos políticos nos anos 50 e 60 do século passado.
Nasceu em Pias, em 1958, e estudou até ao 2.º ano do antigo ciclo preparatório em Serpa. Continuou os estudos na Escola Secundária de Moura, e mais tarde, já com família constituída, licenciou-se em Gestão Financeira pela Universidade do Algarve. Vive em Moura há 30 anos, onde é presidente da câmara desde 1998, e entretanto já obteve uma pós-graduação em Administração Pública e Desenvolvimento Regional na Perspectiva da União Europeia pela Universidade de Évora.
Tudo no seu dia-a-dia corria em função das dificuldades que hoje qualquer autarca enfrenta no desempenho da sua tarefa, quando alguém lhe diz que tinha sido classificado no site da OneWorld como "presidente da câmara do futuro" da Europa.
"Presidente da câmara do futuro? Eu?", foi o desabafo que lhe saiu vezes sem conta, antes de perceber o que lhe tinha acontecido. Depois quis saber porquê. A sua inclusão no grupo de finalistas está ligada ao reconhecimento do papel que tem tido na condução do processo das energias renováveis no concelho de Moura.
Energia desde Março
Pós-de-Mina batia com a palma da mão na testa, ainda incrédulo. "Como é que lá pelas Américas o pessoal sabe o que faço e o que sou?", perguntava a si próprio.
O seu empenhamento na causa das renováveis tomou corpo no ano 2000, quando os representantes de uma empresa lhe vieram propor que "acolhesse um projecto comunitário para a instalação de pequenas centrais solares".
Nem hesitou. Viu na proposta que lhe foi apresentada a possibilidade de poder dar o primeiro passo num projecto que hoje tem uma dimensão mundial. As pequenas centrais solares foram substituídas por uma apenas que cobre 250 hectares de uma área na freguesia da Amareleja, onde os estudiosos foram descobrir que aquela nesga de terra recebe o maior número de horas solares da Europa. O investimento de 237 milhões de euros, disponibilizado na totalidade pela empresa espanhola Acciona, para produzir energia destinada à rede eléctrica nacional, financiou uma central com 46,41 megawatts (MW) pico e 35 MW de potência de injecção na rede. Está a produzir energia desde Março deste ano.
Pós-de-Mina já nem quer lembrar os momentos em que esteve tentado a "atirar a toalha ao chão", tantos eram os obstáculos e as hesitações dos organismos do Estado e de potenciais interessados em desenvolver um projecto ao qual a autarquia nunca poderia dar corpo pelos colossais investimentos que eram necessários para a instalação da maior central fotovoltaica do mundo.
Um novo projecto
Consumiu muitas energias, "anos de vida", algumas desilusões e ataques de forças políticas opositoras que viam no empreendimento um objectivo megalómano, de promoção pessoal. Pós-de-Mina, que sempre fez questão de se manter equidistante de protagonismos, vê na obra que idealizou o exemplo concreto do que pode o sonho e a perseverança.
Para si, a indicação para integrar o naipe de 10 candidatos ao prémio Personalidade 2008 só por si significa apenas que alguém lá fora consegue ver o que no seu país a luta política ofusca.
O que é importante para Pós-de-Mina é a janela de oportunidades que a sua indicação para personalidade do ano pode vir a propiciar ao seu concelho: "Desde que atraia mais investimento e que esse investimento se traduza na criação de postos de trabalho, agradeço a quem indicou o meu nome."
Em mãos tem já outro projecto de energias renováveis: a rede SunFlower, que envolve oito municípios de oito países europeus (Bulgária, Espanha, França, Grécia, Inglaterra, Itália e República Checa e Portugal).
A personalidade de 2008 agradece a simpática expressão utilizada por um colega presidente de câmara mexicano que o designou "o autarca do futuro". "Ainda não tive o privilégio de o conhecer", diz José Maria Pós-de-Mina.
"Como é que lá nas Américas o pessoal sabe o que faço e o que sou?", perguntou Pós-de-Mina quano soube da distinção

Também na Mongólia

À semelhança do exposto no post anterior, também as crianças da Mongólia puderam sentir os fantásticos benefícios da "democracia" e do capitalismo, com a sua "Revolução Democrática" em 1990, como demonstra este video:



Para saber mais sobre a situação das crianças na Mongólia consultar este site da UNICEF

Quanto à "Revolução Democrática" na Mongólia tentarei fazer, um dia destes, algumas considerações

16 dezembro 2008

Notícias do Leste

No dia em que se comemoram 66 anos do cerco total das tropas nazi-fascistas em Estalinegrado, trago aqui algumas notícias sobre a "democracia" e a qualidade de vida que os povos daquela que foi a primeira experiência socialista do Mundo usufruem, depois da traição de que foram vítimas.

Isto é quanto vale a vida de uma criança, hoje, no Tajiquistão: « Ils veulent vendre le bébé de Fariza pour cent dollars ! »

Entretanto, os neo-nazis continuam a aterrorizar, agredir e matar pessoas em Moscovo e outras cidades russas devido a uma cor de cabelo (nem já de pele) diferente, e o Primeiro-Ministro da Rússia limita-se a chamar-lhes estúpidos, como pode ser visto aqui.

Mas nem tudo vai mal. Com este documentário (dividido em 6 videos que vale a pena ver) podemos ficar a saber, por exemplo, que Moscovo tem mais bilionários que qualquer outra cidade do Mundo. Talvez pudessem dar uma moedinha a estes outros:



Com os devidos agradecimentos ao Gorbatchov...

25 novembro 2008

Democracia(s)

Depois da ilegalização da KSM, Juventude Comunista Checa, (que apesar de tudo continua activa) o Senado checo apresentou uma proposta para a ilegalização do Partido Comunista da Boémia e Morávia (KSCM), partido que teve 13% nas últimas legislativas.
Segundo parece, a razão é porque o KSCM defende a abolição da propriedade privada!

22 outubro 2008

Começou ontem...



Dois mortos e vários feridos, o balanço do primeiro dia da Marcha india exigindo terras na Colômbia.

21 outubro 2008

A Corja

Em Abril de 1974 o povo português conseguiu expulsar do poder a corja que o oprimiu, durante 48 anos. Infelizmente esta corja manteve-se na sociedade portuguesa, escondendo-se de vergonha, renegando aquilo que na realidade eram. Esta espécie de gente, e seus herdeiros, ainda hoje não aceitam o facto de lhes ter sido retirado o poder total de que dispunham, o facto de em alguns pontos do país terem sido completamente desmascarados.
Apesar de a Democracia conquistada ser apenas parcial, faltarem elementos de Democracia social, económica e cultural elementares, o povo português garantiu uma liberdade de expressão que foi, e é, irreversível, porque não está disposto a abdicar dela.
E isto vale para militantes e simpatizantes de (quase) todos os partidos, pois não acredito que a maioria dos militantes, e dirigentes, do PS e PSD não sintam profunda vergonha perante as atitudes abjectas, vis e repugnantes que se podem verificar aqui, aqui ou aqui.
É sinceramente deprimente saber que, ainda hoje, existem em Portugal tantos saudosos dos métodos e propósitos da Pide, dos crimes de Salazar e do Fascismo que oprimiu, empobreceu e aviltou o nosso país durante 48 anos.
Felizmente o povo português é maior que isto. Muito maior. Isto é apenas a escória do nobre povo que é o povo português, um povo que tem leis e que se rege pelas normas da civilidade e respeito pelos direitos dos outros.

Vejamos o que diz a lei portuguesa acerca dos direitos de propaganda? A Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, aprovada quando o PSD tinha maioria na Assembleia da República, referendada por Cavaco Silva e promulgada por Mário Soares, no artigo 3º refere que “a afixação ou inscrição de mensagens de propaganda é garantida, na área de cada município, nos espaços e lugares públicos necessariamente disponibilizados para o efeito pelas câmaras municipais.”
O acórdão nº 636/95 do Tribunal Constitucional, cuja relatora foi a militante do PSD Assunção Esteves, veio esclarecer este artigo da seguinte forma: “A questão de constitucionalidade desta norma fundam-na os recorrentes numa interpretação que lhe atribui "o efeito de viabilizar a circunscrição a esses lugares da prática de acções propagandísticas". Segundo a formulação do pedido, o poder que por tal norma se atribui às câmaras municipais abre-se a um "inteiro arbítrio [destas] na disponibilização e localização de espaços e discriminação na sua atribuição sem que a lei estabeleça garantias mínimas". Isso, acrescenta-se, opera uma "restrição ilegítima" da liberdade de propaganda, afrontando, assim, os artigos 37º, nº 1, e 18º, nºs. 2 e 3, da Constituição.
Mas do enunciado da norma do artigo 3º, nº 1, aqui em apreço, e do seu contexto de sentido, não pode derivar-se um qualquer sentido de limitação do exercício da liberdade de propaganda constitucionalmente consagrada. E não pode porque essa norma está aí tão-só a desenvolver a funcionalidade de imposição de um dever às câmaras municipais. Este dever de disponibilização de espaços e lugares públicos para afixação ou inscrição de mensagens de propaganda – que radica, afinal, na dimensão institucional desta liberdade e na corresponsabilização das entidades públicas na promoção do seu exercício – não está, por qualquer modo, a diminuir a extensão objectiva do direito.”
Assim, entendem os conselheiros que as Câmaras Municipais não só estão impedidas de limitar, seja de que forma for, a liberdade de propaganda, como têm o dever de facultar espaços próprios, cumulativos com outros previstos na lei. Assim se destroçam as críticas destes aprendizes de Pides/bufos à Câmara Municipal do Seixal.
O Acórdão começa, além do mais, por referir-se à Constituição Portuguesa, da seguinte forma: “A Constituição, no artigo 37º, garante a todos "o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações".” Donde se depreende que o/os bufos que denunciaram quem fazia aquele ou outro mural, e a polícia que os interpela é que incorrem num violação da Constituição. Já que o carácter não é para todos, que seja ao menos a Lei. Prossegue o Acórdão: “Incluindo-se no domínio especialmente protegido dos direitos, liberdades e garantias enunciados no título II, este direito apresenta uma dimensão essencial de defesa ou liberdade negativa: é, desde logo, um direito ao não impedimento de acções, uma posição subjectiva fundamental que reclama espaços de decisão livres de interferências, estaduais ou privadas.” Logo, quem faz um mural ou pratica qualquer outro acto de propaganda política está no pleno gozo de uma liberdade consagrada constitucional e legalmente, não podendo, de forma alguma, ser importunado pelas autoridades policiais ou por um repugnante esbirro civil.
Mais ainda, o acórdão refere que: “Esta natureza de liberdade que, em primeira linha, caracteriza o direito e que vai ligada à sua dimensão individual-subjectiva não afasta definitivamente o papel do Estado na promoção de condições que o tornem efectivo. O direito não tem uma dimensão única individual-subjectiva. Tem ainda uma dimensão funcional ou institucional que o liga aos desafios de legitimidade-legitimação da ordem constitucional‑democrática. A liberdade de expressão [e a de propaganda política que nela se radica] constitui mesmo um momento paradigmático de afirmação do duplo carácter dos direitos fundamentais, de direitos subjectivos e de elementos fundamentantes de ordem objectiva da comunidade. É que a regulação constitucional da liberdade de expressão não está só a determinar, delimitar e assegurar o estatuto jurídico do indivíduo. Por ela adquire realidade e "toma forma a ordem da Democracia e do Estado de Direito" (Konrad Hesse, Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland, 16ª edição, Heidelberga, 1988, pág. 119).
Também a Lei eleitoral 14/79, protege este direito político inalienável do povo português, nomeadamente no artigo 139º que refere que: “Aquele que roubar, furtar, destruir, rasgar ou por qualquer forma inutilizar, no todo ou em parte, ou tornar ilegível, o material de propaganda eleitoral afixado ou o desfigurar, ou colocar por cima dele qualquer material com o fim de o ocultar será punido com a prisão até seis meses e multa de 1.000$ a 10.000$.”
Muito mais haveria a dizer acerca deste assunto, tanto a nível legal como de carácter de quem o despoletou. Para as questões legais aconselho a consulta de alguns documentos, como a lei atrás referida onde se diz que “Aquele que, durante a campanha eleitoral, utilizar a denominação, a sigla ou o símbolo de partido ou coligação com o intuito de o prejudicar ou injuriar será punido com prisão até um ano e multa de 1.000$ a 5.000$.” Assim espero que antes do início das campanhas eleitorais esta gente retire as tarjas alusivas ao PCP, que contrafez, com o intuito de o prejudicar ou injuriar. Quanto ao carácter, volto a dizer que a única coisa que me sossega é o facto de saber que a larga maioria dos militantes, dirigentes e simpatizantes dos partidos políticos a que esta gente pertence, sente tanta repugnância como eu deste tipo de atitudes.



P.S.- Qualquer violação do prescrito na lei de propaganda reveste o carácter de contra-ordenação e não de crime. Já a publicação de imagens de cidadãos sem o seu consentimento…



08 outubro 2008

As Lições da Crise

Em 7 de Agosto de 1901, em plena crise capitalista, Lenine publica no jornal Iskra este artigo, intitulado As Lições da Crise. Destaco estas frases:
“As lições da crise, que expuseram o absurdo de subordinar a produção social á propriedade privada, são tão evidentes que até a imprensa burguesa pede agora mais supervisão, por exemplo sobre os bancos. Contudo, nenhuma supervisão irá evitar que os capitalistas manobrem as suas empresas (de forma fraudulenta) em tempo de expansão, que acabarão por entrar em bancarrota, mais cedo ou mais tarde (…)
Lembramos também os casos relatados no Iskra, de capitalistas que estendem o horário de trabalho e despedem trabalhadores conscientes da sua posição de classe, para os substituir por outros mais submissos. (…)”

Parece que não mudou muito desde o tempo de Lenine.

03 outubro 2008

Crises capitalistas

Um dos elementos constitutivos do marxismo-leninismo que prova a inevitabilidade do seu triunfo, num futuro mais ou menos distante, é a força da sua teoria, baseada na análise materialista e dialéctica da História, e de toda a realidade social. Este excerto que transcrevo faz parte do Manual de Economia Política, editado em 1955 pela Academia das Ciências da URSS, que traduzi do francês (ou pelo menos tentei) e que pode ser visto na integra aqui. O capítulo que trata da questão das crises capitalistas é de uma correcção analítica perfeita, o que de resto pode ser confirmado através deste pequeno trecho:

"O Estado Burguês, num período de crise, age em socorro dos capitalistas, através de subvenções em dinheiro, sendo que o peso destas cai, em última análise, sobre as massas laboriosas.
Utilizando o seu aparelho de violência e coerção, o Estado ajuda os capitalistas a conduzir a sua ofensiva contra o nível de vida dos trabalhadores e camponeses. Tudo isso aumenta a pauperização das massas laboriosas.
Por outro lado as crises mostram a incapacidade total do Estado burguês em se sobrepor, por pouco que seja, ás leis espontâneas do capitalismo, nos países capitalistas não é o Estado que dirige a economia, pelo contrário é o Estado, ele próprio, que é dominado pela economia capitalista, submisso do grande capital. (…)

A crise mostra que a sociedade contemporânea poderia produzir infinitamente mais que o necessário para melhorar as condições de vida do povo trabalhador, se um punhado de proprietários privados, que lucram milhões com a miséria do povo, não se assenhoreassem da terra, das fábricas, das máquinas, etc. (V. LENINE: «As lições da crise»)

Cada crise faz aproximar-se o colapso do modo de produção capitalista. Como é durante as crises que se manifestam de forma particularmente clara e aguda as contradições insanáveis do capitalismo, que testemunham a inevitabilidade do seu fim, os economistas burgueses tentam, a todo o custo, escamotear a verdadeira natureza e causas da crise. Querendo escamotear a inevitabilidade das crises no regime capitalista, declaram que as crises são devidas a causas fortuitas, que podem ser ultrapassadas, mantendo o sistema capitalista de economia.
Com este fim os economistas da burguesia proclamam que a causa das crises reside ou na ruptura do equilíbrio dos fiéis da produção ou no atraso da procura em relação à oferta, e propõem para salvar o capitalismo das crises o recurso à produção de armamento e à guerra.
Na realidade a falta de equilíbrio da produção, assim como a contradição entre a produção e o consumo, não são defeitos fortuitos do modo capitalista de produção, mas as formas
inevitáveis da manifestação da contradição fundamental do capitalismo, que não será suprimida enquanto exista o capitalismo. (…)
No intervalo das crises, os defensores da burguesia proclamam com grande difusão o fim das crises e a entrada do capitalismo numa via de desenvolvimento sem crises; a crise seguinte revela o erro de tais afirmações. Invariavelmente a vida trás à luz do dia a inconsistência total dos remédios, de qualquer tipo, propostos para salvar o capitalismo das crises."

27 setembro 2008

Pela reabertura dos SAP de Corroios e Seixal!

A Comissão de Utentes da Saúde do Concelho do Seixal apresentou uma petição na Assembleia da República pela reabertura dos SAP's de Corroios e do Seixal, na continuação da sua luta pelo direito à saúde que têm todos os cidadãos portugueses, e que o Governo de Sócrates está apostado em acabar. Fica aqui a intervenção do deputado do PCP, Bruno Dias:

Senhor Presidente,Senhoras e Senhores Deputados,
Em primeiro lugar, queremos saudar vivamente as Comissões de Utentes do Concelho do Seixal; e destacar esta notável participação dos utentes da saúde e das populações, lado a lado com os eleitos do Poder Local. Foi uma resposta inequívoca de protesto e de luta, que incluiu esta Petição com 40 mil subscritores (petição n.º 417/X). Aqui, não foram os patrões dos hipermercados que mandaram recolher assinaturas - foram as populações que se mobilizaram e se fizeram ouvir, exigindo a imediata reabertura dos SAP de Corroios e do Seixal.
O que se impõe é que o Governo de uma vez por todas ouça estas vozes e ponha cobro a esta situação inaceitável. Mas o Governo e a maioria PS fazem-se de cegos e surdos.
Aliás, o Grupo Parlamentar do PS até já aqui afirmou que nenhum SAP foi encerrado em Portugal. Hoje o PS ainda vai dizer que os SAP de Corroios e Seixal não eram SAP! O PS dirá de resto que o problema é a falta de médicos. E nós, que andamos há anos a alertar para isso, sublinhamos que não é a fechar as portas aos serviços que os médicos hão de aparecer...
Seguramente, o PS dirá ainda que os utentes destes serviços até ficaram melhor depois destes encerramentos! É o argumento habitual. Mas como o descaramento não tem limites, o Governo na resposta à Deputada Relatora escreve esta coisa extraordinária: «a quase totalidade dos utentes do Centro de Saúde do Seixal passou a ter médico de família atribuído, ficando a existir 4.787 utentes sem médico».
Para o Governo, estes milhares de pessoas são um "quase", um pormenor estatístico. No Concelho do Seixal (diz o Governo na sua resposta ao PCP), há 41.278 utentes sem médico de família - e isto, mesmo depois do encerramento dos SAP e das "limpezas de ficheiros". Perante a evidente falta de transportes públicos nesta área, o Governo encerra serviços de proximidade e as pessoas vivem pior!
O encerramento destes SAP foi "comunicado" na véspera, com uma folha de papel na porta. Veja-se como o Governo "dialoga" com o poder local: numa reunião no dia 10 de Julho, apresenta a "proposta" do encerramento e concorda em manter a questão em aberto. No dia 17 à noite, as portas do SAP aparecem fechadas!
Em Agosto, perante o protesto, o Governo anunciou que as consequências dos encerramentos dos SAP iriam ser «monitorizadas e avaliadas». Um mês depois, a ARS tentou convencer autarcas e utentes da "boa" razão dos encerramentos, e incapazes de o provar, prometeram apresentar os dados em falta... até hoje! Passou um ano. Confrontado pelo PCP, o Governo diz que os dados estão na ARS! É uma vergonha!
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
O que se impõe não é o encerramento e diminuição de serviços - é a abertura e a melhoria de serviços! A reabertura destes SAP é uma medida urgente. Assim como a colocação de médicos, enfermeiros, técnicos de saúde, administrativos. Assim como a construção do Hospital do Seixal, que permita aliviar (e não sobrecarregar, como agora) as urgências do Hospital Garcia de Orta.
Mas com orientações e decisões destas, bem podem mudar os nomes e rostos: é cada vez mais evidente que esta política de direita é prejudicial à saúde.
Disse.

19 setembro 2008

Traição

A traição consuma-se. O Código dos patrões para os trabalhadores vai ser aprovado pela bancada do PS, este mês ou no próximo. E assim este cumpre mais uma vez a sua missão histórica, de satisfazer todos os interesses e desejos dos capitalistas e monopolistas, nacionais e internacionais, atacando as conquistas e direitos do povo português, em especial os trabalhadores.
Coadjuvado pela UGT, organização anti-sindical criada para dividir o sindicalismo português e para ocupar um lugar na concertação social, cinicamente, em nome dos trabalhadores, põe agora em prática as ambições do patronato que o governo do PSD/CDS-PP não conseguiu concretizar no Código de 2003. Nessa altura, também devido á oposição deste mesmo PS.
A traição é tanto maior quanto o número de trabalhadores que votaram no PS, atendendo às promessas eleitorais, que prometiam revogar as normas mais gravosas do Código de Bagão Félix. Uma lei laboral, já de si prejudicial para os trabalhadores, elaborada pela direita mais reaccionária, consegue agora ser revista para pior por um governo e partido ditos socialistas.
E é ainda mais revoltante por ser aprovada por um partido ao serviço do Capitalismo, nacional e internacional, que ostenta o nome de Socialista. É uma afronta para a memória de milhares ou milhões de pessoas que morreram a lutar pelo socialismo ou para os verdadeiros socialistas de hoje, que lutaram e lutam precisamente pelo contrário daquilo que pratica este governo e partido, ditos socialistas.
Os povos já provaram inúmeras vezes ao longo da História que conseguem ter a lucidez e força para impedir os retrocessos sociais que as classes dominantes pretendem impor. O povo português já o provou. Neste momento é imperioso que os trabalhadores portugueses tomem consciência do ataque de que estão sendo vítimas e tenham a lucidez e força para impedir.
A caducidade de TODAS as convenções colectivas de trabalho, a desregulamentação de horários, o fim das “horas” extraordinárias, o reforço do poder discricionário do patronato, o ataque aos direitos e liberdade sindical e outros aspectos deste Código levariam as relações laborais em Portugal direitinhas para o início do século XX. Depois de todas as transformações e conquistas conseguidas no século passado, á custa de sacrifícios indizíveis e milhões de mortos seria, além de uma tragédia para o progresso social, uma desonra para a nossa geração.
Não podemos aceitar que um bando de incompetentes mentirosos e vaidosos, ao serviço da reacção social, venha reverter aquilo que foi alcançado com tanto sacrifício.

A Luta (vai ser difícil, mas) continua!

Quem diria?

"Nos últimos dez anos, sete empresas de «catering» que fornecem refeições preparadas a escolas e hospitais terão lesado o Estado em 172,6 milhões de euros. As empresas combinavam os preços a apresentar nos concursos, trocavam informações comerciais e asseguravam dois terços do mercado de prestação de serviços de fornecimento de refeições.
A notícia avançada pelo Jornal de Negócios fala no «maior cartel de sempre apanhado em Portugal». A suspeita de cartelização é da Autoridade da Concorrência (AdC), que iniciou as investigações em Fevereiro de 2007 e formalizou agora a acusação, a que o Jornal de Negócios teve acesso.
De acordo com a acusação da AdC, o cartel era formado pela Gertal e Itau (ambas do grupo Trivalor), ICA e Nordigal (com os mesmos sócios), Eurest, Uniself e Sodexho."

Notícia aqui

18 setembro 2008

O socialismo é o caminho

Não será novidade para ninguém que o sistema económico capitalista está em crise. As falências de multinacionais financeiras sucedem-se, o imperialismo já não consegue como dantes ditar as leis conforme pretende, e mesmo as camadas sociais menos conscientes se apercebem como são, diariamente, exploradas.
Contudo esta não é uma crise nova ou conjuntural. Pelas contradições que geram no seu interior, a crise é característica inseparável de qualquer sistema económico baseado na exploração de uma classe por outra. Deste modo, mesmo nos anos áureos do neo-liberalismo, nas décadas de 80 e 90, o capitalismo encontrava-se em crise. E mesmo que venha a recuperar, em crise continuará.
Os fanáticos do neo-liberalismo, incluindo os que dizem não ser liberais, andam desvairados em busca de justificações e causas para a crise, andando sempre em círculos à volta da realidade, mas sem nunca olharem para ela. Invariavelmente acabam por usar o dogma fantasioso e místico de Adam Smith da “mão invisível”, fazendo pequenos ajustes, conforme os interesses. Deste modo, tudo resulta de uma mecânica “natural” da economia, do funcionamento do mercado e outros eloquentes dogmas liberais. Alguns, em desespero certamente, afirmam mesmo que a crise é benéfica porque acabará por fortalecer as economias. Esta sim, uma ideologia utópica, dogmática e desfasada da realidade.
O capitalismo apresentou, no século XX, três modelos diferentes entre si, mas que na prática têm o mesmo objectivo, a perpetuação da exploração do Homem pelo Homem. O modelo social-democrata demonstrou que pode eficazmente atingir este objectivo, promovendo o divisionismo no interior do movimento dos trabalhadores, criando sistemas sociais que minimizem os conflitos de classe ou cedendo, temporária e parcialmente, às reivindicações dos trabalhadores. A versão terrorista do capitalismo, sem dúvida a mais repugnante e odiosa, o fascismo, provou que pode também, através da criação de um Estado terrorista, da promoção da guerra, da opressão e repressão de todo o tipo de progresso social, defender os interesses do capital, contra os dos trabalhadores.
Por sua vez o Liberalismo, clássico ou recauchutado, provou ser uma versão utópica do capitalismo, o Eden dos capitalistas. De facto, abandonar tudo às leis do mercado, onde tudo tem preço, mas nada tem valor, seria o modelo mais benéfico para os capitalistas. Assistimos no nosso tempo a aberrações como a mercantilização de valores como as relações sociais, a cultura e mesmo o afecto ou amor, deixando as necessidades de todos à mercê da ganância de alguns. Como pode o capitalista aceitar que a saúde, educação, segurança social, áreas que tanto rendimento poderiam dar, não estejam á sua disposição, efectivando assim a sua liberdade (para explorar, claro)? A ganância faz com que se cometam todo o tipo de atitudes, por mais contrárias que sejam aos interesses da comunidade, originando injustiças insustentáveis. Aí a solução é emendar alguns erros, para logo os voltar a cometer, através da social-democracia ou a repressão e guerra com o capitalismo terrorista.
Os candidatos á Casa Branca parecem representar, cada um, estas soluções. Obama propõe que se emendem alguns erros e adoptem alguns paliativos, para que assim que seja possível se volte ao mesmo capitalismo selvagem. Mccain propõe a guerra, seja com quem for, o terrorismo imperialista, a fome, o agravamento da exploração dos países em desenvolvimento, para resolver a crise nos países “desenvolvidos”.
Nenhuma destas é a solução de que necessitam os povos de todo o Mundo. Bem pelo contrário. Os comunistas devem, neste momento assumir o seu papel de vanguarda da classe operária e de todos os trabalhadores, assim como de outras camadas ou povos explorados ou vítimas de opressão económica, demonstrando que existe um caminho, mas o do Socialismo, que de resto é tão bem descrito pelo Cantigueiro aqui.

12 setembro 2008

Ode à estupidez

A imbecilidade dos jornalistas do semanário Sol atingiu um novo patamar. E desta vez parece difícil de ultrapassar, senão vejamos.
Segundo o nosso bem conhecido Manuel A. Magalhães (MAM) o Partido Comunista Português “encostou à direita”, e o responsável por esta proeza é o Bloco de Esquerda.
Para o referido semanário, que cita fontes do BE, esta viragem à direita é provada pelo facto de Jerónimo de Sousa ter mostrado preocupação com o recente recrudescimento do crime violento e consequente sentimento de insegurança entre a população portuguesa. De facto, é de conhecimento de toda a gente que a atitude verdadeiramente de esquerda será a do BE que, segundo o jornalista, foi o único partido a ignorar este tema durante o Verão (para fazer mais um jeitinho ao governo?). Para João Semedo aliás “o PCP colou-se escandalosamente à extrema-direita”.
O texto, que prova o facto de não haver limites para a idiotice entre os jornalistas do Sol, é um verdadeiro tratado ao preconceito, divulgando por exemplo que o eleitorado do PCP são os “trabalhadores reformados dos meios urbanos e subúrbios, que sentem de perto a insegurança.” Será justo, seguindo a mesma ordem de ideias, a menos que o Sol se tenha baseado num estudo científico para fazer esta afirmação, supor que o eleitorado do BE serão os indivíduos que cometem os referidos crimes, o verdadeiro eleitorado de esquerda. Mas da de confiança.
Seria lógico que o PCP, sendo como é, o partido da classe operária e de todos os trabalhadores portugueses, defendesse que nada se fizesse para impedir o crime violento. Todos sabemos que os verdadeiros prejudicados dos assaltos a gasolineiras, bancos, carrinhas de transportes, supermercados, etc., são os capitalistas detentores das referidas empresas que, obviamente, ou se encontram no conforto de sua casa ou tão bem guardados por seguranças que nem se preocupam com estes problemas. Os trabalhadores e empregados dessas empresas, que se encontram nos locais dos eventuais crimes, esses, no fundo até desfrutam dos assaltos. Deve saber com certeza muito bem ser assaltado ao fim de um dia de trabalho, ser vítima de coacção física e psicológica, arriscado a levar um tiro ou a ficar sem alguns pertences que eventualmente tenham consigo. Os trabalhadores sempre foram beneficiados pelo crime, e suspeito mesmo que são eles que os cometem.
Não me vou referir à economia socialista e ao desemprego virtualmente inexistente nem ás taxas de criminalidade de alguns países que implementaram (ou pretenderam implementar) esse tipo de economias. Não podia contudo deixar passar mais este ataque asqueroso e desprezível por parte de um jornal português contra o PCP.
Só lamento pelo jornalista. A vida de gente como este MAM deve ser tão triste, tendo em conta que vivem com o objectivo de atacar, denegrir e menosprezar o PCP, e ter de assistir a iniciativas como a última Festa do Avante! ou saber que este partido tem milhares de militantes dispostos a dar tudo, por aquilo que acreditam ser o melhor para o país e para o povo português.

11 setembro 2008

As cinco dificuldades para escrever a verdade

Após termos assistido, mais um ano, à forma como a comunicação social portuguesa tratou a informação relativa à Festa do Avante!, parece-me oportuno reler o texto de Brecht, As cinco dificuldades para escrever a verdade:


Hoje, o escritor que deseje combater a mentira e a ignorância tem de lutar, pelo menos, contra cinco dificuldades. É-lhe necessária a coragem de dizer a verdade, numa altura em que por toda a parte se empenham em sufocá-la; a inteligência de a reconhecer, quando por toda a parte a ocultam; a arte de a tornar manejável como uma arma; o discernimento suficiente para escolher aqueles em cujas mãos ela se tornará eficaz; finalmente, precisa de ter habilidade para difundir entre eles. Estas dificuldades são grandes para os que escrevem sob o jugo do fascismo; aqueles que fugiram ou foram expulsos também sentem o peso delas; e até os que escrevem num regime de liberdades burguesas não estão livres da sua acção.

1- A coragem de dizer a verdade. É evidente que o escritor deve dizer a verdade, não a calar nem a abafar, e nada escrever contra ela. É sua obrigação evitar rebaixar-se diante dos poderosos, não enganar os fracos, naturalmente, assim como resistir à tentação do lucro que advém de enganar os fracos. Desagradar aos que tudo possuem equivale a renunciar seja o que for. Renunciar ao salário do seu trabalho equivale por vezes a não poder trabalhar, e recusar ser célebre entre os poderosos é muitas vezes recusar qualquer espécie de celebridade. Para isso precisa-se de coragem. As épocas de extrema opressão costumam ser também aquelas em que os grandes e nobres temas estão na ordem do dia. Em tais épocas, quando o espírito de sacrifício é exaltado ruidosamente, precisa o escritor de muita coragem para tratar de temas tão mesquinhos e tão baixos como a alimentação dos trabalhadores e o seu alojamento.Quando os camponeses são cobertos de honrarias e apontados como exemplo, é corajoso o escritor que fala da maquinaria agrícola e dos pastos baratos que aliviariam o tão exaltado trabalho dos campos. Quando todos os altifalantes espalham aos quatro ventos que o ignorante vale mais do que o instruído, é preciso coragem para perguntar: vale mais por quê? Quando se fala de raças nobres e de raças inferiores, é corajoso o que pergunta se a fome, a ignorância e a guerra não produzem odiosas deformidades. É igualmente necessária coragem para se dizer a verdade a nosso próprio respeito, sobre os vencidos que somos. Muitos perseguidos perdem a faculdade de reconhecer as suas culpas. A perseguição parece-lhes uma monstruosa injustiça. Os perseguidores são maus, dado que perseguem, e eles, os perseguidos, são perseguidos por causa da sua virtude. Mas essa virtude foi esmagada, vencida, reduzida à impotência. Bem fraca virtude ela era! Má, inconsistente e pouco segura virtude, pois não é admissível aceitar a fraqueza da virtude como se aceita a humidade da chuva. É necessária coragem para dizer que os bons não foram vencidos por causa da sua virtude, mas antes por causa da sua fraqueza. A verdade deve ser mostrada na sua luta com a mentira e nunca apresentada como algo de sublime, de ambíguo e de geral; este estilo de falar dela convém justamente à mentira. Quando se afirma que alguém disse a verdade é porque houve outros, vários, muitos ou um só, que disseram outra coisa, mentiras ou generalidades, mas aquele disse a verdade, falou em algo de prático, concreto, impossível de negar, disse a única coisa que era preciso dizer.Não se carece de muita coragem para deplorar em termos gerais a corrupção do mundo e para falar num tom ameaçador, nos lugares onde a coisa ainda é permitida, da desforra do Espírito. Muitos simulam a bravura como se os canhões estivessem apontados sobre eles; a verdade é que apenas servem de mira a binóculos de teatro. Os seus gritos atiram algumas vagas e generalizadas reivindicações, à face dum mundo onde as pessoas inofensivas são estimadas. Reclamam em termos gerais uma justiça para a qual nada contribuem, apelam pela liberdade de receber a sua parte dum espólio que sempre têm partilhado com eles. Para esses, a verdade tem de soar bem. Se nela só há aridez, números e factos, se para a encontrar forem precisos estudos e muito esforço, então essa verdade não é para eles, não possui a seus olhos nada de exaltante. Da verdade, só lhes interessa o comportamento exterior que permite clamar por ela. A sua grande desgraça é não possuírem a mínima noção dela.

2- A inteligência de reconhecer a verdade. Como é difícil dizer a verdade, já que por toda a parte a sufocam, dizê-la ou não parece à maioria uma simples questão de honestidade. Muitas pessoas pensam que quem diz a verdade só precisa de coragem. Esquecem a segunda dificuldade, a que consiste em descobri-la. Não se pode dizer que seja fácil encontrar a verdade.Em primeiro lugar, já não é fácil descobrir qual verdade merece ser dita. Hoje, por exemplo, as grandes nações civilizadas vão soçobrando uma após outra na pior das barbáries diante dos olhos pasmados do universo. Acresce ainda o facto de todos sabermos que a guerra interna, dispondo dos meios mais horríveis, pode transformar-se dum momento para o outro numa guerra exterior que só deixará um montão de escombros no sitio onde outrora havia o nosso continente. Esta é uma verdade que não admite dúvidas, mas é claro que existem outras verdades. Por exemplo: não é falso que as cadeiras sirvam para a gente se sentar e que a chuva caia de cima para baixo. Muitos poetas escrevem verdades deste gênero. Assemelham-se a pintores que esboçassem naturezas mortas a bordo dum navio em risco de naufragar. A primeira dificuldade de que falamos não existe para eles e, contudo, têm a consciência tranquila. "Esgalham" o quadro num desprezo soberano pelos poderosos, mas também sem se deixarem impressionar pelos gritos das vítimas. O absurdo do seu comportamento engendra neles um "profundo" pessimismo que se vende bem; os outros é que têm motivos para se sentirem pessimistas ao verem o modo como esses mestres se vendem. Já nem sequer é fácil reconhecer que as suas verdades dizem respeito ao destino das cadeiras e ao sentido da chuva: essas verdades soam normalmente de outra maneira, como se estivessem relacionadas com coisas essenciais, pois o trabalho do artista consiste justamente em dar um ar de importância aos temas de que trata.Só olhando os quadros de muito perto é que podemos discernir a simplicidade do que dizem: "Uma cadeira é uma cadeira" e "Ninguém pode impedir a chuva de cair de cima para baixo". As pessoas não encontram ali a verdade que merece a pena ser dita.Alguns se consagram verdadeiramente às tarefas mais urgentes, sem medo aos poderosos ou à pobreza, e, no entanto, não conseguem encontrar a verdade. Faltam-lhe conhecimentos. As velhas superstições não os largam, assim como os preconceitos ilustres que o passado frequentemente revestiu de uma forma bela. Acham o mundo complicado em demasia, não conhecem os dados nem distinguem as relações. A honestidade não basta; são precisos conhecimentos que se podem adquirir e métodos que se podem aprender. Todos os que escrevem sobre as complicações desta época e sobre as transformações que nela ocorrem necessitam de conhecer a dialética materialista, a economia e a história. Estes conhecimentos podem adquirir-se nos livros e através da aprendizagem prática, por mínima que seja a vontade necessária. Muitas verdades podem ser encontradas com a ajuda de meios bastante mais simples, através de fragmentos de verdades ou dos dados que conduzem à sua descoberta. Quando se quer procurar, é conveniente ter-se um método, mas também se pode encontrar sem método e até sem procura. Contudo, através dos diversos modos como o acaso se exprime, não se pode esperar a representação da verdade que permite aos homens saber como devem agir. As pessoas que só se empenham em anotar os fatos insignificantes são incapazes de tornar manejáveis as coisas deste mundo. O objetivo da verdade é uno e indivisível. As pessoas que apenas são capazes de dizer generalidades sobre a verdade não estão à altura dessa obrigação.Se alguém está pronto a dizer a verdade e é capaz de a reconhecer, ainda tem de vencer três dificuldades.

3-A arte de tornar a verdade manejável como uma arma. O que torna imperiosa a necessidade de dizer a verdade são as consequências que isso implica no que diz respeito à conduta prática. Como exemplo de verdade inconsequente ou de que se poderão tirar consequências falsas, tomemos o conceito largamente difundido, segundo o qual em certos países reina um estado de coisas nefasto, resultante da barbárie. Para esta concepção, o fascismo é uma vaga de barbárie que alagou certos países com a violência de um fenómeno natural. Os que assim pensam, entendem o fascismo como um novo movimento, uma terceira força justaposta ao capitalismo e ao socialismo (e que os domina). Para quem partilha esta opinião, não só o movimento socialista, mas também o capitalismo teriam podido, se não fosse o fascismo, continuar a existir, etc. Naturalmente que se trata de uma afirmação fascista, de uma capitulação perante o fascismo. O fascismo é uma fase histórica na qual o capitalismo entrou; por consequência, algo de novo e ao mesmo tempo de velho. Nos países fascistas, a existência do capitalismo assume a forma do fascismo, e não é possível combater o fascismo senão enquanto capitalismo, senão enquanto forma mais nua, mais cínica, mais opressora e mais mentirosa do capitalismo. Como se poderá dizer a verdade sobre o fascismo que se recusa, se quem diz essa verdade se abstém de falar contra o capitalismo que engendra o fascismo? Qual será o alcance prático dessa verdade? Aqueles que estão contra o fascismo sem estar contra o capitalismo, que choramingam sobre a barbárie causada pela barbárie, assemelham-se a pessoas que querem receber a sua fatia de assado de vitela, mas não querem que se mate a vitela. Querem comer vitela, mas não querem ver sangue. Para ficarem contentes, basta que o magarefe lave as mãos antes de servir a carne. Não são contra as relações de propriedade que produzem a barbárie, mas são contra a barbárie. As recriminações contra as medidas bárbaras podem ter uma eficácia episódica, enquanto os auditores acreditarem que semelhantes medidas não são possíveis na sociedade onde vivem. Certos países gozam do raro privilégio de manter relações de propriedade capitalistas por processos aparentemente menos violentos. A democracia ainda lhes presta os serviços que noutras partes do mundo só podem ser prestados mediante o recurso à violência, quer dizer, aí a democracia chega para garantir a propriedade privada dos meios de produção. O monopólio das fábricas, das minas, dos latifúndios gera em toda a parte condições bárbaras; digamos que em alguns lugares a democracia torna essas condições menos visíveis. A barbárie torna-se visível logo que o monopólio já só pode encontrar protecção na violência nua. Certas nações que conseguem preservar os monopólios bárbaros sem renunciar às garantias formais do direito, nem a comodidades como a arte, a filosofia, a literatura, acolhem carinhosamente os hóspedes cujos discursos procuram desculpar o seu país natal de ter renunciado a semelhantes confortos: tudo isso lhes será útil nas guerras vindouras. É licito dizer-se que reconheceram a verdade, aqueles que reclamam a torto e a direito uma luta sem quartel contra a Alemanha, apresentada como verdadeira pátria do mal da nossa época, sucursal do inferno, caverna do Anticristo? Desses, não será exagerado pensar que não passam de impotentes e nefastos imbecis, já que a conclusão do seu blá-blá-blá aponta para a destruição desse país inteiro e de todos os seus habitantes (o gás asfixiante, quando mata, não escolhe os culpados).O homem frívolo, que não conhece a verdade, exprime-se através de generalidades, em termos nobres e imprecisos. Encanta-o perorar sobre "os" alemães ou lançar-se em grandes tiradas sobre "o" Mal, mas a verdade é que nós, aqueles a quem o homem frívolo fala, ficamos embaraçados, sem saber que fazer de semelhantes ditames. Afinal de contas, o nosso homem decidiu deixar de ser alemão? E lá por ele ser bom, o inferno vai desaparecer? São desta espécie as grandes frases sobre a barbárie. Para os seus autores, a barbárie vem da barbárie e desaparece graças à educação moral que vem da educação. Que miséria a destas generalidades, que não visam qualquer aplicação prática e, no fundo, não se dirigem a ninguém. Não nos admiremos que se digam de esquerda, "mas" democratas, os que só conseguem elevar-se a tão fracas e improfícuas verdades. A "esquerda democrática" é outra destas generalidades-álibis onde correm a acoitarem-se as pessoas inconsequentes, isto é, os incapazes de viver até as últimas consequências as verdades que quer a esquerda, quer a democracia contêm. Reclamar-se alguém da "esquerda democrática" significa, em termos práticos, que pertence ao grupo dos ineptos para revolucionar ou conservar as coisas, ao clã dos generalistas da verdade.Não é a mim, fugido da Alemanha com a roupa que tinha no corpo, que me vão apresentar o fascismo como uma espécie de força motriz natural impossível de dominar. A obscuridade dessas descrições esconde as verdadeiras forças que produzem as catástrofes. Um pouco de luz, e logo se vê que são homens a causa das catástrofes. Pois é, amigos: vivemos num tempo em que o homem é o destino do homem.O fascismo não é uma calamidade natural, que se possa compreender a partir da "natureza" humana. Mas mesmo confrontados com catástrofes naturais, há um modo de descrevê-las digno do homem, um modo que apela para as suas qualidades combativas.O cronista de grandes catástrofes como o fascismo e a guerra (que não são catástrofes naturais) deve elaborar uma verdade praticável, mostrar as calamidades que os que possuem os meios de produção infligem às massas imensas dos que trabalham e não os possuem.Se se pretende dizer eficazmente a verdade sobre um mau estado de coisas, é preciso dizê-la de maneira que permita reconhecer as suas causas evitáveis. Uma vez reconhecidas as causas evitáveis, o mau estado de coisas pode ser combatido.

4- Discernimento suficiente para escolher os que tornarão a verdade eficaz. Tirando ao escritor a preocupação pelo destino dos seus textos, as tradições seculares do comércio da coisa escrita no mercado das opiniões deram-lhe a impressão de que a sua missão terminava logo que o intermediário, cliente ou editor, se encarregava de transmitir aos outros a obra acabada. O escritor pensava: falo e ouve-me quem me quiser ouvir. Na verdade, ele falava e quem podia pagar ouvia-o. Nem todos ouviam as suas palavras, e os que as ouviam não estavam dispostos a ouvir tudo o que se lhes dizia. Tem-se falado muito desta questão, mas mesmo assim ainda não chega o que se tem dito: limitar-me-ei aqui a acentuar que "escrever a alguém" tornou-se pura e simplesmente "escrever". Ora não se pode escrever a verdade e basta: é absolutamente necessário escrevê-la a "alguém" que possa tirar partido dela. O conhecimento da verdade é um processo comum aos que lêem e aos que escrevem. Para dizer boas coisas, é preciso ouvir bem e ouvir boas coisas. A verdade deve ser pesada por quem a diz e por quem a ouve. E para nós que escrevemos, é essencial saber a quem a dizemos e quem no-la diz. Devemos dizer a verdade sobre um mau estado de coisas àqueles que o consideram o pior estado de coisas, e é desses que devemos aprender a verdade. Devemos não só dirigir-nos às pessoas que têm uma certa opinião, mas também aos que ainda a não têm e deviam tê-la, ditada pela sua própria situação. Os nossos auditores transformam-se continuamente! Até se pode falar com os próprios carrascos quando o premio dos enforcamentos deixa de ser pago pontualmente ou o perigo de estar com os assassinos se torna muito grande. Os camponeses da Baviera não costumam querer nada com revoluções, mas quando as guerras duram demais e os seus filhos, no regresso, não arranjam trabalho nas quintas, tem sido possível ganhá-los para a revolução. Para quem escreve, é importante saber encontrar o tom da verdade. Um acento suave, lamentoso, de quem é incapaz de fazer mal a uma mosca, não serve. Quem, estando na miséria, ouve tais lamúrias, sente-se ainda mais miserável. Em nada o anima a cantilena dos que, não sendo seus inimigos, não são certamente seus companheiros de luta. A verdade é guerreira, não combate só a mentira, mas certos homens bem determinados que a propagam.

5- Habilidade para difundir a verdade. Muitos, orgulhosos de ter a coragem de dizer a verdade, contentes por a terem encontrado, porventura fatigados com o esforço necessário para lhe dar uma forma manejável, aguardam impacientemente que aqueles cujos interesses defendem a tomem em suas mãos e consideram desnecessário o uso de manhas e estratagemas para a difundir. Frequentemente, é assim que perdem todo o fruto do seu trabalho. Em todos os tempos, foi necessário recorrer a "truques" para espalhar a verdade, quando os poderosos se empenhavam em abafá-la e ocultá-la. Confúcio falsificou um velho calendário histórico nacional, apenas lhe alterando algumas palavras. Quando o texto dizia: "o senhor de Kun condenou à morte o filósofo Wan por ter dito frito e cozido", Confúcio substituía "condenou à morte" por "assassinou". Quando o texto dizia que o Imperador Fulano tinha sucumbido a um atentado, escrevia "foi executado". Com este processo, Confúcio abriu caminho a uma nova concepção da história. Na nossa época, aquele que em vez de "povo", diz "população", e em lugar de terra", fala de "latifúndio", evita já muitas mentiras, limpando as palavras da sua magia de pacotilha. A palavra "povo" exprime uma certa unidade e sugere interesses comuns; a "população" de um território tem interesses diferentes e opostos. Da mesma forma, aquele que fala em "terra" e evoca a visão pastoral e o perfume dos campos favorece as mentiras dos poderosos, porque não fala do preço do trabalho e das sementes, nem no lucro que vai parar aos bolsos dos ricaços das cidades e não aos dos camponeses que se matam a tornar fértil o "paraíso". "Latifúndio" é a expressão justa: torna a aldrabice menos fácil. Nos lugares onde reina a opressão, deve-se escolher, em vez de "disciplina", a palavra "obediência", já que mesmo sem amos e chefes a disciplina é possível, e caracteriza-se portanto por algo de mais nobre que a obediência. Do mesmo modo, "dignidade humana" vale mais do que "honra": com a primeira expressão o indivíduo não desaparece tão facilmente do campo visual; por outro lado, conhece-se de ginjeira o gênero de canalha que costuma apresentar-se para defender a honra de um povo, e com que prodigalidade os gordos desonrados distribuem "honrarias" pelos famélicos que os engordam. Ao substituir avaliações inexactas de acontecimentos nacionais por notações exactas, o método de Confúcio ainda hoje é aplicável. Lenine, por exemplo, ameaçado pela polícia do czar, quis descrever a exploração e a opressão da ilha Sakalina pela burguesia russa. Substituiu "Rússia" por "Japão" e "Sakalina" por "Coréia". Os métodos da burguesia japonesa faziam lembrar a todos os leitores os métodos da burguesia russa em Sakalina, mas a brochura não foi proibida, porque o Japão era inimigo da Rússia. Muitas coisas que não podem ser ditas na Alemanha a propósito da Alemanha, podem sê-lo a propósito da Áustria. Há muitas maneiras de enganar um Estado vigilante.Voltaire combateu a fé da Igreja nos milagres, escrevendo um poema libertino sobre a Donzela de Orleans, no qual são descritos os milagres que sem dúvida foram necessários para Joana d'Arc permanecer virgem no exército, na Corte e no meio dos frades. Pela elegância do seu estilo e a descrição de aventuras galantes inspiradas na vida relaxada das classes dirigentes, levou estas a sacrificar uma religião que lhes fornecia os meios de levar essa vida dissoluta. Mais e melhor deu assim às suas obras a possibilidade de atingir por vias ilegais aqueles a quem eram destinadas. Os poderosos que Voltaire contava entre os seus leitores favoreciam ou toleravam a difusão dos livros proibidos, e desse modo sacrificavam a polícia que protegia os seus prazeres. E o grande Lucrécio sublinha expressamente que, para propagar o ateísmo epicurista confiava muito na beleza dos seus versos. Não há dúvida de que um alto nível literário pode servir de salvo-conduto à expressão de uma ideia. Contudo, muitas vezes desperta suspeitas. Então, pode ser indicado baixá-lo intencionalmente. É o que acontece, por exemplo, quando sob a forma desprezada do romance policial, se introduz à socapa, em lugares discretos, a descrição dos males da sociedade. O grande Shakespeare baixou o seu nível por considerações bem mais fracas, quando tratou com uma voluntária ausência de vigor o discurso com que a mãe de Coriolano tentou travar o filho, que marchava sobre Roma: Shakespeare pretendia que Coriolano desistisse do seu projecto, não por causa de razões sólidas ou de uma emoção profunda, mas por uma certa fraqueza de carácter que o entregava aos seus velhos hábitos. Encontramos igualmente em Shakespeare um modelo de manhas na difusão da verdade: o discurso de Marco Antonio perante o corpo de César, quando repete com insistência que Brutus, assassino de César, é um homem honrado, descrevendo ao mesmo tempo o seu acto, e a descrição do acto provoca mais impressão que a do autor. Jonathan Swift propôs numa das suas obras o seguinte meio de garantir o bem-estar da Irlanda: meter em salmoura os filhos dos pobres e vendê-los como carniça no talho. Através de minuciosos cálculos, provava que se podem fazer grandes economias quando não se recua diante de nada. Swift armava voluntariamente em imbecil, defendendo uma maneira de pensar abominável e cuja ignomínia saltava aos olhos de todos. O leitor podia-se mostrar mais inteligente, ou pelo menos mais humano que Swift, sobretudo aquele que ainda não tinha pensado nas consequências decorrentes de certas concepções. São consideradas baixas as actividades úteis aos que são mantidos no fundo da escala: a preocupação constante pela satisfação de necessidades; o desdém pelas honrarias com que procuram engodar os que defendem o país onde morrem de fome; a falta de confiança no chefe quando o chefe nos leva a todos à catástrofe; a falta de gosto pelo trabalho quando ele não alimenta o trabalhador; o protesto contra a obrigação de ter um comportamento de idiotas; a indiferença para com a família, quando de nada serve a gente interessar-se por ela. Os esfomeados são acusados de gulodice; os que não têm nada a defender, de covardia; os que duvidam dos seus opressores, de duvidar da sua própria força; os que querem receber a justa paga pelo seu trabalho, de preguiça, etc. Numa época como a nossa, os governos que conduzem as massas humanas à miséria, têm de evitar que nessa miséria se pense no governo, e por isso estão sempre a falar em fatalidade. Quem procura as causas do mal, vai parar à prisão antes que a sua busca atinja o governo. Mas é sempre possível opormo-nos à conversa fiada sobre a fatalidade: pode-se mostrar, em todas as circunstâncias, que a fatalidade do homem é obra de outros homens. Até na descrição de uma paisagem se pode chegar a um resultado conforme à verdade, quando se incorporam à natureza as coisas criadas pelo homem.

Recapitulação

A grande verdade da nossa época (só seu conhecimento em nada nos faz avançar, mas sem ela não se pode alcançar nenhuma outra verdade importante) é que o nosso continente se afunda na barbárie porque nele se mantêm pela violência determinadas relações de propriedade dos meios de produção. De que serve escrever frases corajosas mostrando que é bárbaro o estado de coisas em que nos afundamos (o que é verdade), se a razão de termos caído nesse estado não se descortina com clareza? É nossa obrigação dizer que, se se tortura, é para manter as relações de propriedade. Claro que ao dizermos isso perdemos muitos amigos; aqueles que são contra a tortura porque julgam ser possível manter sem ela as relações de propriedade (o que é falso). Devemos dizer a verdade sobre as condições bárbaras que reinam no nosso país a fim de tornar possível a acção que as fará desaparecer, isto é, que transformará as relações de propriedade. Devemos dizê-la aos que mais sofrem com as relações de propriedade e estão mais interessados na sua transformação, ou seja: aos operários e aos que podemos levar a aliarem-se com eles, por não serem proprietários dos meios de produção, embora associados aos lucros e benefícios da exploração de quem produz. E, é claro, devemos proceder com astúcia.Devemos resolver em conjunto, e ao mesmo tempo, estas cinco dificuldades, já que não podemos procurar a verdade sobre condições bárbaras sem pensar nos que sofrem essas condições e estão dispostos a utilizar esse conhecimento. Além disso, temos de pensar em apresentar-lhes a verdade sob uma forma susceptível de se transformar numa arma nas suas mãos, e simultaneamente com a astúcia suficiente para que a operação não seja descoberta e impedida pelo inimigo.São estas as virtudes exigidas ao escritor empenhado em dizer a verdade.

27 agosto 2008

O novo (velho) Imperialismo

O Imperialismo tem ao longo dos tempos encontrado as formas mais eficazes a adoptar, em cada momento histórico, para assegurar a consecução dos seus objectivos. A vida e a História provam-no. O imperialismo na sua forma terrorista e mais extrema não foi bem sucedido porque encontrou a resistência heróica dos povos em toda a Europa, Ásia e África, mas também porque os seus projectos colidiam com os de outras potências imperialistas.
Se até meados do século XX as potências colonizadoras controlavam directamente largas regiões do Mundo, exercendo sobre elas uma jurisdição reconhecida e assumida, com os processos de independência esse tipo de domínio expirou. Mas o imperialismo não se rendeu. Pelo contrário, iria encontrar novas formas de exercer o domínio que lhe permite proceder á exploração das matérias-primas e força de trabalho indispensáveis à acumulação capitalista.
O estudo dos métodos utilizados é bastante útil, na medida em que provam vários factos: a inexistência de limites ou escrúpulos por parte dos agentes do imperialismo; a sua habilidade para se transformarem de agressores em vítimas, aos olhos do Mundo, distorcendo por completo a verdade histórica; a imbecilidade dos lacaios do poder imperialista que subscrevem as teses oficiais dos agentes do imperialismo, ou por desconhecerem a verdade ou por pensarem que uma mentira mil vezes repetida se torna verdadeira. Quanto a este último ponto, aconselho uma visita a alguns blogs portugueses, que conseguem ir mais longe que os próprios promotores e defensores oficiais do imperialismo.
Uma das características mais repugnantes, e repetida, da prática imperialista contemporânea é a actuação dos seus agentes e agências de forma encoberta. Além da actuação baseada na selvajaria, como a invasão de países soberanos à revelia do Direito Internacional, o bombardeamento de populações civis ou a coacção psicológica, económica e mesmo militar, e talvez mais importante que aquela, um sem número de organizações agem, em todo o Mundo, em abono do imperialismo.
Essas entidades actuam sempre em nome dos “direitos humanos”, da “democracia”, do ambiente (mais recentemente) e outros eloquentes e benignos valores. Umas assumem a forma de ONG’s, outras de think tanks, outras ainda de câmaras de comércio ou institutos de estudos de relações internacionais. Mas uma observação mais aprofundada permite assimilar os reais objectivos destas organizações, que pouco têm que ver com estes nobres objectivos.
A tarefa de expor esta realidade, que concretiza uma importante parte da acção imperialista no mundo actual, constitui certamente uma pretensão fundamental para perceber o actual estádio do Capitalismo. Contudo nunca seria alguém como eu que o poderia levar a cabo com sucesso, tanto por falta de tempo, como por falta de capacidade. Ainda assim aproveito para deixar algumas notas.
O recente caso da Geórgia é paradigmático da realidade a que me refiro. Antes de mais importa esclarecer que interesse terá um país como a Geórgia para o imperialismo? Em si mesmo pouco. Contudo numa estratégia de cerco a outros países que podem constituir ameaça ao poder da maior potência imperialista do Mundo ou para chegar aos recursos energéticos de países vizinhos (Azerbaijão, por exemplo) tem uma importância fundamental.
Assim, a forma como as tais “organizações não-governamentais” apoiaram a instalação de um poder fantoche em Tbilisi é demonstrativo da sua forma de actuação em outras partes o Mundo. Se até aos anos 80 as actividades, agora desenvolvidas por esta gente sinistra, eram asseguradas pela CIA com o apoio de agentes nacionais (e nós também os tivemos…) agora são essas organizações, financiadas pelo Departamento de Estado, pela USAID e pelas grandes multinacionais que o fazem. O movimento Kmara, que ajudou Saakashvili a chegar ao poder, foi financiado por exemplo pela Freedom House, pelo National Endowment for Democracy ou pela fundação do (misterioso) milionário George Soros, que foi criada em específico para este país, mas que as tem em vários outros países.
A Freedom House, por exemplo, é famosa pelo relatório anual em que revela o ranking dos países mais livres do Mundo. Ironicamente, o país com maior população encarcerada do Mundo, tanto em termos absolutos como relativos, e mesmo historicamente, está classificado como o mais livre possível nesse ranking. Recebe a maior parte do seu orçamento do governo norte-americano (sabendo todos nós o quão ciosos são os norte-americanos com o dinheiro dos seus impostos) e militam nas suas fileiras gente tão distinta como Zbigniew Brzezinski, Samuel Huntington ou Donald Rumsfeld. Tem ainda ligações com a ilustre organização terrorista, anteriormente conhecida por Liga Mundial Anti-Comunista, onde se contavam alguns nazis (provavelmente) arrependidos. A Freedom House criou ainda um comité especificamente para a região do Cáucaso, o Comité Americano para a Paz no Cáucaso.
O National Endowment for Democracy (NED) é uma espécie de Al-Qaeda da democracia, na medida em que financia e suporta outras organizações que gravitam à sua volta. Um dos mais “ilustres” membros do NED é o nosso bem conhecido Frank Carlucci, bem como o neo-fascista Francis Fukuyama, ou o falcão de Belgrado Wesley Clark.
As fundações do magnata George Soros, grande defensor da liberalização das drogas leves (o sucesso que faria nos acampamentos do BE...), e cuja origem da fortuna não é totalmente conhecida, estão espalhadas um pouco por todo o planeta. Entre as proezas mais conhecidas de George Soros estão o Crash da Bolsa de Londres em 92, assim como o financiamento a rodo de organizações que defendem a paz no Mundo, enquanto entra no capital accionista da Helliburton…
Outras organizações deste tipo são, por exemplo a Foundation for Defense of Democracies (Fundação para a Defesa das Democracias, FDD), que curiosamente foi fundada dois dias depois do 11 de Setembro de 2001 e hoje é campeã da campanha em curso para promover a guerra com o Irão. De todas a mais famosa, e talvez mais importante, é o Council on Foreign Relations, financiada, por exemplo, pela Lockheed, ExxonMobil, Chevron, ou JP Morgan. Entre os seus membros contam-se George Bush, pai, Dick Cheney, Alan Greenspan, Richard Holbrooke, Henry Kissinger (inevitável nestas coisas da paz), John Mccain, e novamente Zbigniew Brzezinski.
Outra organização, mais focada na região e nos interesses económicos, é a Câmara de Comércio Estados Unidos – Azerbaijão, financiada pela BP, Chevron, ExonnMobil ou Halliburton, por exemplo. Uma visita pelo site desta organização é elucidativa dos interesses que serve.
Assim soltos, estes factos não provam grande coisa, mas ilustram bem os métodos utilizados pelo Imperialismo no sentido de assegurar os seus interesses. Provam que sempre que utilizam a palavra “democracia” querem significar precisamente o seu contrário. Provam ainda que os meios de comunicação social, tanto os portugueses como os internacionais, estão completamente dominados por esses interesses, ou melhor são parte fundamental da actuação Imperialista contemporânea.

15 agosto 2008

Conta-me como foi

A RTP1 está a retransmitir uma série portuguesa chamada Conta-me como Foi. A série é, sem dúvida e tal como a anunciam, uma das melhores produções nacionais de sempre, com grandes actores, óptimos cenários e adereços, etc. …
O argumento da série, segundo julgo saber, baseia-se no dia-a-dia de uma família lisboeta (pretensamente) típica, dos finais dos anos 60. Parece ser também intenção dos autores dar a conhecer aos portugueses do século XXI a vida em Portugal nos anos finais da ditadura. Neste particular, contudo, a série não é propriamente fiel à realidade das condições socioeconómicas, culturais ou políticas do país na altura.
A família retratada vive, ao longo de toda a série, com um desafogo relativo. É compreensível que os autores não se baseassem numa família das classes mais empobrecidas e exploradas da altura, caso em que, certamente, haveria pouco para contar. Seria pouco mais que um círculo vicioso onde as necessidades fisiológicas básicas do ser humano seriam entrecortadas por um período de trabalho de entre dez a doze horas e, eventualmente, uma actividade lúdica de fraca qualidade, possivelmente passada à volta de uns copos de álcool. Isto para o homem, pois a mulher além do trabalho fora de casa teria ainda as tarefas domésticas para realizar.
Contudo, numa época em que o revisionismo histórico (que não me parece ser a intenção da série em causa) se assume cada vez com mais força, numa tentativa de branquear a ditadura fascista que oprimiu o povo português durante 48 anos, a série poderá ajudar a formular uma ideia completamente errada da vida das famílias portuguesas naquela altura.
A justificação dada para a existência desse relativo desafogo económico é dada pelo facto de o “chefe da família” exercer duas profissões e de os restantes membros da família também trabalharem de forma excepcional. Contudo, naquele tempo, como hoje, quem trabalhava dificilmente conseguiria fugir á penúria que era gerada, precisamente, pela exploração do seu trabalho, mesmo para os funcionários do Estado (como é o caso) cujos salários se encontravam exauridos.
O engano acerca da qualidade de vida na altura poderá ser criado pelo facto de a família possuir telefone, rádio, televisão, máquina de lavar roupa, frigorífico, electricidade (sem a qual os anteriores objectos seriam inúteis), água canalizada, uma casa de boa qualidade (com quartos para cada membro da família), roupas de grande qualidade e em quantidade, efectuarem viagens ao estrangeiro, ter um membro a frequentar o ensino superior, etc. …
Sendo certo que havia uma melhoria relativa da qualidade de vida no país em relação às décadas anteriores, em especial devido às remessas dos emigrantes, apenas uma ínfima minoria dos portugueses poderia sequer sonhar com este estilo de vida.
Mesmo sem ter qualquer tipo de dado para o afirmar, atrevo-me a dizer que as zonas mais miseráveis do país se encontravam na cintura de Lisboa. Bairros como a Brandoa, Galinheiras ou Musgueira conheciam uma realidade bem diferente. Muitas famílias viviam em casas abarracadas (para contrastar com as apalaçadas dos monopolistas) onde não havia electricidade, (tão-pouco os objectos referidos), água canalizada, ou o mínimo de conforto. Os bairros eram constituídos por ruas completamente desordenadas, por vezes não alcatroadas, onde a lama se tornava insuportável, e por vezes mortífera como nas inundações de 67 (pelo menos 458 mortos). As crianças passavam os dias entre a frequência de uma escola opressora e a deambulação pelas ruas, sem haver qualquer tipo de estruturas ou programas de tempos livres. A sua indumentária poderia variar de uns andrajos inqualificáveis a uma roupa minimamente apresentável, mas sem a qualidade referida. Havia ainda crianças que só muito tarde calçavam os seus primeiros pares de sapatos.
Noutro plano as referências aos comunistas na série também pouco condizem com a realidade, chegando o protagonista a vender uma tipografia a um militante do PCP para ser utilizada nas actividades do Partido! Ou o facto de os que lutam contra o Regime serem oriundos das classes altas, frequentando as faculdades, correspondendo certamente mais à ideia que faço dos esquerdistas da altura, que daqueles que efectivamente resistiam contra a opressão fascista.
Volto a dizer que a série é de grande qualidade, e em nenhum momento pretende ser um documento histórico. Contudo se quisermos contar como foi, de certeza que haveria muito mais para contar…







Arredores de Lisboa, anos 60


Brandoa, anos 60


Santa Iria da Azóia, 1965

14 agosto 2008

Os EUA e o Imperialismo

A recente audácia georgiana de atacar as forças de manutenção de paz russas na Ossétia do Sul deixou o Mundo perplexo, não estivéssemos a falar de dois países com uma diferença de população de 137 milhões de habitantes, entre outras comparações possíveis de fazer, igualmente abissais. Mas, alguém acreditará que a decisão deste ataque partiu da exclusiva vontade do “Presidente” da Geórgia, ou dos órgãos soberanos da Geórgia? Claro que não, porque a Geórgia deixou de ser um país independente e soberano, para passar a ser o 51º estado norte-americano, com a chamada Revolução Rosa. A prova caricata disto está dada quando o Presidente da Geórgia se dirige à Nação georgiana… em Inglês!
As investidas do Imperialismo têm despertado maior atenção noutras regiões do Globo. Nuns casos devido ás guerras que foram movidas (ou estão sendo minuciosamente preparadas), noutros pela novidade que constitui a existência de governos e eleição de lideres políticos independentes dos interesses das grandes multinacionais, como na América Latina. Contudo, na Europa os anos do consulado de Bush foram também anos propícios para o avanço do Imperialismo, por vezes de forma feroz, outras delicadamente.
O caso da Revolução Rosa na Geórgia é um exemplo, mas podemos referir a chamada Revolução Laranja, na Ucrânia, a “independência” do Kosovo, (além de toda a atitude revanchista em relação à Sérvia), os escudos anti-míssil, as adesões à NATO, o próprio (falhado?) Tratado de Lisboa, numa lista que poderia ter muitos mais exemplos.
A atitude dos Estados Unidos da América, e em especial do seu Presidente, têm oscilado entre o criminoso, na forma como tem apoiado a acção da Geórgia e o ridículo, quando Bush vem criticar a acção russa.
As declarações provocatórias e belicistas dos EUA, nomeadamente com referências à Guerra-Fria e ameaças de revisão das relações com a Federação Russa, são evidências claras dos propósitos norte-americanos. Ao mesmo tempo que tentam desestabilizar as relações internacionais e interferir na soberania de outros Estados, fazem passar as culpas para aqueles que, no fundo, são vítimas da cobiça e mesquinhez imperialista.
Em relação à forma como a comunicação social tem transmitido a situação, além do seu papel fundamental de adulterar a verdade dos factos e servir os interesses do Capitalismo, há uma ou outra nota mais grosseiras que não podem passar em claro. A TVI por exemplo (com o rigor característico) dizia qualquer coisa como “a Geórgia tornou-se independente do Império Soviético em 1991”. Em relação à última parte da frase não comento, mas quanto à primeira seria bom saber se a Geórgia é mais independente agora ou quando fazia parte de uma União de Repúblicas em pé de igualdade (pelo menos juridicamente) com as restantes catorze. Não será evidente, que se a URSS estivesse subjugada aos interesses russos ou russófonos, como é correntemente propalado, teria tido mais que tempo para anexar a Ossétia do Sul à República Socialista Soviética Autónoma da Ossétia do Norte?

26 julho 2008

Também na América

Trabalhadores que recebem o ordenado mínimo vivem no limite.

Colômbia

O ex-senador, antigo presidente do Senado colombiano e líder do principal partido da coligação que apoia o governo de Álvaro Uribe, Carlos Garcia, foi preso por “suspeitas” de ligações ás milícias de extrema-direita do país, nomeadamente as Autodefensas Unidas de Colombia. Inacreditável!
Quem diria que um dos mais importantes membros da oligarquia que governa a Colômbia (com uma democracia exemplar e um regime bastante legítimo, a fazer fé nos jornais e alguns blogs) tem ligações ás AUC?
De facto essa oligarquia e as milícias de extrema-direita não passam de duas faces da mesma moeda, uns são facções da outra. Uma é a facção política, a outra a facção terrorista de um poder ao serviço de latifundiários, banqueiros, industriais e outros monopolistas, além das grandes empresas americanas e dos traficantes de droga.
A Santa Ingrid, entretanto, continua a sua cruzada na luta pela paz. Conceito de paz estranho, o dela. A paz de quem deve aceitar ser expulso das suas terras pelas milícias dos latifundiários, sem esboçar qualquer resistência A paz de quem deve continuar a ser vítima da opressão mais feroz de um regime criminoso e da miséria mais aviltante, mas calado. Calado porque é a favor da paz. Se não acontece-lhe o mesmo que ao sindicalista indígena Guillermo Rivera Fúquene, e a muitos milhares de outros democratas que têm lutado pela dignidade do povo colombiano.

Entretanto o Departamento de Estado norte-americano anuncia que estabeleceu o acordo de “livre comércio” com o governo colombiano. Esse acordo já esteve no epicentro do debate entre os candidatos à Casa Branca e é de extrema importância para os Estados Unidos. Aborrecido é que os únicos colombianos que vão ganhar alguma coisa com este acordo é essa tal oligarquia. Afortunadamente essa “alguma coisa” é bastante.
A declaração de Condoleezza Rice é elucidativa da relação entre a Colômbia e os EUA. O tom de quem dá uma festa na cabeça de um cão e o incita a prosseguir o bom trabalho escorre em cada frase.
A Colômbia é um daqueles países onde a pobreza se torna ainda mais abjecta, pela riquezas imensas do país, que são mais que suficientes para proporcionar um nível de vida bastante aceitável a toda a população. Os abutres que a governam em conjunto com os EUA fazem com que milhões de pessoas vivam na mais completa pobreza, ao mesmo tempo que se fazem vítimas daqueles que lutam por uma vida digna, pela paz e pelo progresso social.
Quem sabe, um dia, o POVO (colombiano) VENCERÁ!

14 julho 2008

Jornalismo (?) Português

Já se tornaram um ritual de Verão, uma parte constituinte da nossa Silly Season, além de um dos passatempos preferidos de muitos bloggers, os ataques à Festa do Avante! que se concretizam através de argumentos sobre as FARC e a sua suposta presença na Festa. O Diário de Notícias conseguiu hoje mais uma glória para o jornalismo português (que se sucedem de forma vertiginosa), admitindo que “As FARC não vêm à Festa…” contudo “…estão no coração do PCP”. Rompendo todas as regras do jornalismo o DN publica este artigo em forma de notícia. Se fosse publicado como um artigo de opinião não deixava de ser estúpido e grosseiro, contudo seria admissível no sentido em que o jornal é deles (sejam lá quem forem) e fazem o que querem com ele. Contudo publicá-lo como uma notícia é perfeitamente inadmissível, e não é apenas uma questão de forma, mas também de objectivo de quem o faz. Apesar de ficar sem palavras para qualificar e descrever enormidades destas é importante não as deixar passar em branco, pela gravidade e falta de respeito que evidenciam.

11 julho 2008

Maurice Thorez



Maurice Thorez, secretário-geral do Partido Comunista Francês durante mais de 30 anos, faleceu em 11 de Julho há 44 anos. Grande resistente contra a ocupação Nazi e um extraordinário secretário-geral do PCF.

22 junho 2008

“La semana laboral se extenderá en ocasiones hasta las 78 horas semanales y se podrá encerrar a los inmigrantes sin papeles durante 18 meses antes de expulsarlos. En algunas zonas, la policía ya tiene derecho a detener a cualquier persona 42 días sin cargos. En otras, los servicios secretos cuentan con autorización para husmear en los correos electrónicos sin mandato judicial. No piense en China; tampoco en Estados Unidos. Todo esto sucede en la Unión Europea, abanderada durante décadas del modelo social que más protegía al ciudadano. Los expertos no se ponen de acuerdo sobre el alcance del giro, pero coinciden en que el avance de la derecha en casi toda Europa ha dejado su impronta en la UE.”

É raro, mesmo perante evidências flagrantes, os meios de comunicação social, expressão do poder capitalista, exporem assuntos de forma clara e objectiva, especialmente quando se refere a questões como os direitos sociais e laborais. Estes foram objecto das maiores concessões feitas pelo poder capitalista em resultado das lutas dos trabalhadores durante todo o Século XX, e são hoje o campo onde esse poder tenta recuperar o terreno perdido.
Hoje, contudo, foi possível encontrar dois artigos, um no El País e outro no Jornal de Notícias, que apesar de forma parcial e sempre de uma perspectiva capitalista, denunciam o carácter retrógrado, injusto e exploratório de novas politicas que a União Europeia (supremo instrumento do processo de recuperação capitalista na Europa) pretende aplicar.
Uma dessas medidas, que seria inimaginável há alguns anos atrás, prevê que a semana de trabalho possa ser alargada até 60, 65 ou mesmo 78 horas semanais (se as partes concordarem, claro!). A outra medida prende-se com a visão objectivada que o Capital tem dos trabalhadores. Essa medida prevê que os países possam prender (sem terem cometido qualquer crime) até 18 meses os imigrantes ilegais antes de os expulsarem, ou deitarem fora quando não precisarem deles.
Os títulos e o conteúdo de ambas as noticiais surpreendem por tocarem em questões tabu e por apontarem de certa forma para o cerne da questão. É óbvio que o El País ainda vem com a “história” dos Direitos Humanos, uma falácia na medida em que os direitos que foram garantidos resultaram de uma luta hercúlea entre forças antagónicas, e que serão mais ou menos garantidos e efectivados conforme a correlação de forças entre progressistas e reaccionários, e nunca como resultado de documentos assinados por aqueles cujos interesses de classe são prejudicados pela efectivação desses direitos. Ou o JN também exprime opiniões que tentam culpar a China por estas medidas, quando esta é mais vítima que culpada deste processo, em vez de procurar as responsabilidades nos especuladores internacionais, nos teóricos e políticos neoliberais e na própria natureza predatória do Capitalismo.
Com o resultado do referendo irlandês tornou-se óbvio que a UE se encontra desesperada por fazer concretizar estas medidas, para logo a seguir encontrar outras e outras que permitam agravar a exploração dos trabalhadores. A crise actual teve a virtude de provar que o processo de acumulação capitalista não pode ser fundado estruturalmente em engenhosos mecanismos financeiros nem numa economia virtual, mas sim à boa maneira do Século XIX na exploração do trabalho produtivo.
O artigo do El País destaca ainda o facto de forças de Direita estarem a ganhar terreno em toda a Europa e o de partidos e forças que se advogam de Esquerda serem colaboradores, ou mesmo líderes deste processo de retrocesso social.
De facto, é extraordinário, observando a realidade e a vida, constatar a forma como a teoria de Marx, Engels e Lenine são hoje, pelo menos tão válidas (se não mais) como quando foram produzidas. E isto é assim tanto para a análise sistémica do Capitalismo, como da cilada social-democrata ou dos mecanismos de conformação social e ideológica.

Aqui ficam os links para esses artigos que merecem ser lidos. El País, Jornal de Notícias

13 junho 2008

Os tratantes

Depois de tanta pompa, festejos e loas ao Tratado de Lisboa o povo irlandês, percebendo o que estava em causa, rejeitou o embuste preparado por uns quantos eurocratas. Foi o “Não” a mais neo-liberalismo, militarismo e federalismo. Foi também uma lição de democracia dada pelo povo irlandês àqueles que achavam que podiam gizar um documento desta importância nas costas dos cidadãos.
Quem deve ter ficado um pouco chateado foi o nosso Primeiro-Ministro, que assumiu na Assembleia da República que o tratado era muito importante para a sua “carreira política” (haja alguém que explique ao homem, que o povo português não está minimamente preocupado com a sua “carreira política”).
Agora é claro que os tratantes vão tentar encontrar forma de contornar este contratempo democrático, mas talvez os povos continuem a resistir aos seus intentos.
“Os poderosos fazem planos para 10 mil anos”, mas por vezes esses planos são detidos pela resistência ou desejo popular.

10 junho 2008

Não ao Tratado

Na próxima Quinta-Feira a Irlanda vota em Referendo a Constituição Europeia recauchutada, também conhecida por Tratado de Lisboa. Não sendo a melhor, é a única maneira de derrotar esta tentativa dos políticos europeus, e dos interesses por eles representados, aprofundarem a ofensiva neo-liberal. Independentemente do voto dos irlandeses a luta contra a efectivação do Tratado tem de ser posta em prática. Isto porque sendo algo de bastante negativo em Dezembro, quando foi aprovado, os acontecimentos que se seguiram tornaram-no ainda mais prejudicial aos povos europeus, e sobretudo mais difícil de concretizar pelos seus mentores. Se a economia neo-liberal continuar a demonstrar o seu insucesso como tem vindo a fazer nestes últimos meses, o mais certo é que aqueles que tanto louvaram o Tratado nem se lembrem dele em Dezembro deste ano, em especial o anfitrião José Sócrates.
Esperemos assim, que o Não ganhe na Irlanda, mas aconteça o que acontecer a luta contra o Tratado contínua, porque é a luta contra mais liberalismo, mais ataques aos trabalhadores, aos serviços sociais e pelo desenvolvimento dos povos europeus, e de todo o Mundo.

Dia da Raça

Não é que surpreenda quem conhece a personalidade, mas não deixa de ser chocante que alguém que desempenha as funções de Presidente da República de um país democrático (por muito que lhe custe) venha dizer que se comemora o dia da Raça, festividade fascista, que caiu em desuso mesmo antes do fim da ditudura fascista, pelo ridiculo que comporta.


(o 10 de Junho visto por Cavaco Silva)

08 junho 2008

Superar o Capitalismo

O capitalismo nasceu em crise, na medida em que ao mesmo tempo que se afirmava, ia criando as condições para se desenvolverem as circunstâncias que quase permitiram que a classe dominada nas novas relações de produção tivesse tomado o poder político (como em 1848 em Paris, em 1917 na Rússia, ou em 1919 na Alemanha). Assim o capitalismo moderno e industrial poderia não ter passado de um simples momento histórico intermediário entre o capitalismo mercantil de Antigo Regime e a sociedade socialista. Apesar de tudo, com as dificuldades e tragédias conhecidas, o capitalismo sobreviveu. Hoje vive uma crise sistémica bastante grave, que apesar de não se configurar como a crise final e definitiva, tem a utilidade de demonstrar as contradições e fragilidades desta forma de organização económica, política e social que domina o mundo actual.
Condição fundamental para a subsistência do capitalismo é a acumulação de capital que se processa através da exploração dos recursos naturais e do trabalho alheio por parte dos detentores dos meios de produção, mas também através da pura especulação financeira.
Assim se tem verificado ao longo do tempo uma forte propensão dos capitalistas para o investimento em produtos ou serviços não necessários ao desenvolvimento de qualquer actividade produtiva, mas antes com o intuito de vir a realizar mais-valias, resultantes da subida do preço de determinado bem, que muitas vezes é potenciada de forma artificial, através de inúmeros mecanismos bem conhecidos e estudados pelos “economistas” do capitalismo.
Um bom exemplo deste instrumento fundamental do capitalismo foi a subida do preço do petróleo verificada na última sexta-feira. O crude conheceu numa só sessão dos mercados internacionais subidas superiores a 8 e 9 dólares/barril. As razões apontadas pelos “economistas” são a fraqueza do dólar em relação a outras moedas, o aumento da procura ou a diminuição da oferta, o anúncio da possibilidade de aumento das taxas de juro pelo BCE, as declarações de um ministro israelita, sendo que existe uma parafernália infindável de argumentos utilizados para justificar esses aumentos, sem nunca explicar as verdadeiras razões. Entretanto a Stanley Morgan prevê que o barril possa chegar aos 150 dólares em menos de um mês.
O sistema capitalista expõe desta forma uma das suas maiores contradições, consubstanciada no conflito entre a necessidade de acumulação capitalista e o desejo de estabilidade política e social, necessária à manutenção do status quo. Assim não se coíbem de criar graves problemas aos governantes de vários países do Mundo (que não são mais que os administradores políticos e sociais do poder capitalista), promovendo pela sua prática a ocorrência de protestos por parte de sectores da economia, que apesar de integrados no sistema capitalista se encontram numa posição desfavorável. A História tem demonstrado que os especuladores tendem a “puxar a corda” até ela se partir, não conseguindo encontrar um ponto óptimo entre a máxima acumulação compatível com a mínima contestação das classes exploradas (não apenas do proletariado, mas também dos pequenos proprietários). Com o desmoronar da especulação baseada em produtos financeiros muitas vezes virtuais, os especuladores viram-se para o investimento em bens concretos e indispensáveis como os alimentos ou a energia, causando ainda maior sofrimento aos povos e populações de todo o Mundo.
A superação do sistema económico capitalista, com a suas componentes predatórias, venais e nefastas para a Humanidade, afigura-se não só como uma possibilidade, mas como uma necessidade. A derrota do Socialismo na Europa não foi uma vitória definitiva do capitalismo, mas antes uma vitória circunstancial que, apesar de ter causado um enorme retrocesso no desenvolvimento das forças progressistas da Humanidade, não significa o fim da luta de classes, e portanto da História.
A luta dos povos pela emancipação e das classes trabalhadores pelo fim da exploração continua, conhecendo diariamente novos episódios, potenciada por esta crise do capitalismo, que apesar de ainda não reunir as condições para a sua superação, pode proporcionar vitórias parciais em alguns países do Mundo, abrindo caminho para uma verdadeira revolução social.

26 maio 2008

Os Vendilhões (do desbarato)

Os candidatos à liderança do PSD têm defendido a liquidação (por outras palavras, obviamente) do Serviço Nacional de Saúde. Depois de terem entregue as áreas estratégicas do sector produtivo e financeiro aos privados (meios de produção e criação de riqueza), de terem em 2003 e agora, num novo capítulo, em 2008 implementado um processo de retirada de direitos aos trabalhadores (com o intuito de diminuir o custo do factor trabalho, ou aumentar a exploração) pouco resta senão os serviços sociais do Estado (portanto de todos os portugueses, independentemente dos recursos).
Aquelas foram sem dúvida três das grandes conquistas de Abril (fim dos monopólios e nacionalização de sectores estratégicos nacionais; conquista e consagração de, até então inimagináveis, direitos dos trabalhadores; criação de serviços de educação, saúde, solidariedade, etc. universais e sociais) que têm sido revertidas neste processo contra-revolucionário em curso há 32 anos protagonizado pelo PS, PSD e CDS, não sem encontrarem forte resistência daqueles que lutaram por elas e do povo português em geral.
No campo laboral o PS tem o mérito de conseguir apresentar propostas de alteração de um Código do CDS, que não era fácil de piorar, que pretende fazer aquilo que o governo PSD-CDS não teve coragem ou poder para fazer. Assim deixa o PSD com a única alternativa de aplaudir a proposta.
O facto de prometerem a privatização da RTP e da Caixa Geral de Depósitos não é suficiente para saciar as verdadeiras bases do Partido (os grupos económico-financeiros), com as eventuais excepções de Pinto Balsemão e Paulo Teixeira Pinto.
O que é verdadeiramente apetecível é a saúde, educação e segurança social. De facto, se o poder económico tolerou ou tolera uma inadmissível (para os seus interesses) intervenção do Estado nestas áreas, não é por um repentino assomo de consciência social, mas antes porque as lutas dos povos desde, o século XIX, não lhes concedeu alternativa. Contudo para não entrar em crise, o sistema capitalista necessita de proceder continuamente à acumulação de riqueza. Assim, é chegado o momento de pôr a saúde a render (quem quer saúde que a pague já dizia um ministro de Cavaco). O PS começou por liquidar serviços de saúde abrindo o caminho aos privados, contudo instalar uma clínica ou hospital exige um investimento assinalável. Por que não fornece então o Estado as infra-estruturas? Como fez, de resto, com tantas empresas públicas que foram desbaratadas servindo os interesses dos privados e assim incentivando o “empreendedorismo”. Além disso vão vendendo a ideia da insustentabilidade do sistema. Há algum tempo era a segurança social que estava prestes a falir, depois calaram-se, agora é a saúde…
Na educação surge a espantosa ideia do cheque-ensino. O nome é sintomático, quem tiver dinheiro paga a boa educação, quem não tem aprende a ler, escrever e contar até dez. Esta é também outra das concessões feitas pela classe dominante nunca digerida completamente. Então os filhos dos trabalhadores, malandros, andam a estudar quando podiam estar a contribuir para a competitividade do país?
Manuela Ferreira Leite tem neste específico grande vantagem sobre os outros, visto que foi ela que iniciou um processo de ataque contra o direito á educação, quando foi ministra e que tem vindo a ser aprofundado por outros.
Numa edição da semana passada do Público, os candidatos afirmam todos, sem grande pudor (não admira estavam a jogar em casa) que além da segurança e da defesa tudo o resto pode ser privatizado. Sinceramente não percebo porquê. Segundo as leis do mercado, a concorrência entre a GNR e a PSP só poderia beneficiar os cidadãos e a gestão da Força Aérea pela SONAE ou do Exército pelo Milenium BCP, seria bastante mais racional que pelos generais que nunca leram uma palavra de um livro de economia.
Infelizmente para o PSD, o governo do engenheiro Sócrates está a implementar este processo com algum sucesso, se bem que não ao ritmo que os interessados pretenderiam.
O que é certo é que perante esta gente sinistra e venal, o povo português não pode evitar as grandes lutas que se impõem para defender os seus direitos, e quem sabe conquistar uma força que lhe permita seguir um caminho de aprofundamento da democracia política, económica, social e cultural, contra o retrocesso social que significaria o continuar destas políticas.